Pescadores se unem para tentar salvar o trecho mais preservado do Rio Atibaia

Com pouca água, voluntários recolhem lixo acumulado no rio

Nas décadas de 50 e 60 e até nos anos 70 do século passado era comum ver pessoas pescando nas imediações da ponte sobre o Rio Atibaia por onde atualmente passa a Avenida José Paulino. Muitos pescadores que residiam em Campinas tomavam o trem que saia da plataforma que existia ao lado do Mercado Municipal e vinham para o então distrito de José Paulino, onde passavam o dia pescando e retornavam no final da tarde para casa sempre levando uma grande quantidade de peixes. As corredeiras formadas junto às pedras existentes nas imediações do local onde se encontra hoje o Restaurante Beira Rio eram alguns dos pontos preferidos pelos pescadores.

Depois disso, nas décadas que se seguiram, o rio acabou sendo degradado pelo lançamento de esgoto e de resíduos industriais e a fartura de peixes foi sse reduzindo, o que também fez diminuir o interesse dos pescadores, que procuraram outros locais mais propícios à pesca, como os rios Jaguari e Mogi Guaçú, na região.

Nos últimos anos, diversas ações e melhoramentos foram realizados para melhorar a qualidade do Atibaia no trecho que corta Paulínia. Indústrias investiram pesado no tratamento de efuentes e o poder público também fez sua parte colocando para funcionar estações de tratamento de esgoto ao longo do cuurso do manancial, como as do Piçarrão, em Campinas, e a ETE de Paulínia, que já trata mais de 75% do esgoto produzido no perímetro urbano. Agora, o Município planeja com a ajuda de Americana e do Governo do Estado, reitalizar a área do Minipantanal, localizada na Represa do Salto Grande, formada a partir do ponto em que o Jaguari deságua no Atibaia e, juntos, se transformam no Rio Piracicaba. 

Porém, no trecho do Atibaia que cruza os distritos campineiros de Joaquim Egídio e Sousas, mais limpo do que o de Paulínia, a pesca continua sendo um dos principais divertimentos dos moradores daquela região até hoje. Porém, a estiagem dos últimos meses revelou aos ribeirinhos e pescadores uma cruel realidade.  Em época de estiagem e frio, pescador só fisga peixes de couro no Rio Atibaia. Lambari, piapara e piau, só se na ponta oposta ao anzol estiver um de sorte ou de fé. Remar, então, só se for contra a corrente e à pé, porque o baixo nível d’água encalha o barco nas pedras. 

Limpeza do rio

No intervalo da pesca, um grupo de pescadores que costuma se debruçar sobre a ponte que leva à Dona Isabel Fragoso Ferrão (Estrada Municipal CAM-127), em Joaquim Egídio, à beira da Rodovia D. Pedro I, tem se dedicado à remoção de garrafas pets, sacos plásticos e outros dejetos. 

O lazer dos finais de semana virou missão engajada pelo meio ambiente numa sabida Área de Preservação Ambiental. “As pessoas e o governo só se lembram do Atibaia quando ele está baixo. Acontece que, se a gente não faz isso de tirar o lixo, ninguém faz. É voluntário. Nunca vi órgão público aqui cuidando disso, só a concessionária que cuida da rodovia. Não entendo por que tanta coisa desce lá de cima, talvez de Valinhos pelo Atibaia”, pondera o metalúrgico Alexandre Camilotte de Souza, pescador de final de semana há 8 anos. 

Na opinião de Souza, graças às medidas tomadas pelo governo do Estado, como o bombeamento do volume morto dos reservatórios do Sistema Cantareira, o nível do Atibaia subiu. Um quilômetro à frente, conta ele, na direção da correnteza, um eucalipto que caiu sobre o rio serve de aparador ao que foi lançado ao rio ou à beira da rodovia, muito pela janela dos carros de passeio. 

Sozinho, o aposentado Mário Kemotsú, de 80 anos, já chegou a “pescar” três sacos de sanito cheios de tralhas, num só dia. Calcula que uns dez colegas de pescaria fazem bonito como ele, sem que haja uma organização formal para isso. “Aprendi que todo lugar que é limpo traz boas energias. E também a respeitar a natureza. Economizo água em casa, critico o mal feito, brigo com o governo, que só agora está preocupado com a seca. Falta consciência ambiental e educação”, disse.

É o vendedor Francisco de Assis quem está sempre preparado para saciar a fome dos visitantes e ajeitar os molinetes gastos pelo tempo que caem na mão dele. “Moro no Jardim Tamoio e há 11 anos estou neste ponto. A situação do rio nunca esteve tão feia. Aqui, só meio fio d’água e poeira. No São Conrado, só pedra”, observa, enquanto espera mais uma leva de visitantes se aproximar. “O movimento diminuiu que nem o nível do rio”.

Contra a corrente

Na outra ponta do rio, o professor de remo Antônio Carlos dos Santos, da Associação de Remo de Sousas, conta que já soube de muita gente que “botou o santo para lavar”, esperando pela chuva, que caiu, tímida, ontem. “Não sei se a simpatia funciona, o que tenho certeza é de que a natureza nunca esteve tão louca. No ano passado, quando deu uma chuvarada com granizo, no fim do ano, a correnteza do rio se inverteu por alguns minutos, coisa que foi filmada para que não se duvide”, contou ele, que já perdeu muito com enchentes, na mesma beira, em 2010.

As aulas que ele costumava dar rarearam nos últimos meses, porque nem os caiaques resistem às pedras que se revelam ali e acolá. Depois de um mês e meio sem subir o Atibaia à pé, pela margem, o remador ficou espantado com o que viu no trecho do Condomínio Jardim Botânico, em Sousas. “Passava por cima dessas pedras mais altas, transportando duas pessoas. Agora não dá.”

Ele adianta que, em breve, deve acontecer mais uma edição do Reviva o Rio Atibaia, projeto que tem por objetivo ampliar o debate sobre a revitalização do rio e os planos locais de gestão para a Macrozona 1, que abriga a Área de Preservação Ambiental de Campinas (APA). Além da Associação de Remo de Sousas, a iniciativa é da ONG Jaguatibaia — Associação de Proteção Ambiental — e do Laboratório Farmacêutico MSD.

“Várias ações serão desenvolvidas por pesquisadores e ambientalistas, entre elas a limpeza do rio, mas, para que ela aconteça, é preciso que o nível do Atibaia suba, se não nenhum barco navega”, disse.

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